V DOMINGO DA QUARESMA – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: Is 43,16-21; Sl 125(126); Fl 3,8-14; Jo 8,1-11

 

“A mulher adúltera – Jesus escrevendo no chão”, 1886–1894, J. Tissot (1836–1902)


Ouça o áudio preparado para esta liturgia (pode demorar alguns segundos)

 

⇒ HOMILIA ⇐

As pedras, dos nossos julgamentos

Jo 8,1-11

 

A liturgia deste domingo retomará o tema do perdão e da misericórdia de Deus, porém, com um cenário e uma situação muito diferente da realidade da parábola do Filho Pródigo, objeto de reflexão no domingo passado. Vejamos: enquanto no texto do 4º domingo da quaresma, o filho volta arrependido, por sua própria iniciativa, neste 5º domingo, o texto do evangelista, narra que uma mulher (sem nome) é empurrada pelos mestres da Lei e fariseus até Jesus para ser condenada, por adultério (cf. Jo 8,3).

Ninguém falou ou não se sabia do cúmplice, todos estavam com pedras nas mãos para assassinar a mulher. Estavam armados para cumprir a lei, de acordo com os preceitos machistas, preconceituosos e discriminatórios daquela época. Neste caso, não havia se quer uma atitude de misericórdia e nem defesa do acusado, por que segundo o Levítico (cf. 20,10), a punição sobre o adultério era igual para os dois culpados (homem e mulher): “Se um homem cometer um adultério com a mulher do próximo, o adúltero e a adúltera serão punidos com a morte.” Também no Deuteronômio (cf. 22,22) teremos a mesma orientação para os que cometem adultério.

Aqueles senhores doutores também tinham outra intensão: montar uma armadilha para pegar Jesus em contradição, na interpretação da lei Judaica e no julgamento daquela situação. E Jesus começa a escrever no chão. E como queríamos saber o que ele escreveu!

Alguns estudiosos supõem que Jesus escrevia a frase que logo em seguida diria para os fariseus: “Quem dentre vós não tiver pecado, seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra” (Jo 8,7). E outros especulam que Jesus escreveu os tantos pecados cometidos pelos doutores da lei e fariseus.

As palavras e a postura de Jesus fez com que todos jogassem suas pedras no chão. Saíram calados e desarmados, a começar pelo mais velho (cf. Jo 8,9), que, obviamente, era o mais experiente, tinha conhecimento maior da lei, porém faltava-lhe no coração o perdão e a misericórdia.

Todos foram embora e o tempo agora é somente para Jesus e a Mulher. Ela não pede perdão, não fala nada, até que Jesus pergunta onde estão os acusadores (cf. Jo 8,10). E as palavras de Jesus definem o caminhar daquela pecadora: “Podes ir, e de agora em diante não peques mais” (Jo 8,11).

De agora em diante aquela mulher viverá uma caminhada de conversão e de reconhecimento concreto do amor de Deus, voltará justificada com certeza, por que atenderá o pedido de Jesus: não peques mais.

Quantos ensinamentos podemos retirar deste texto de João para o nosso caminhar cristão, como discípulos que querem testemunhar o Senhor? Olhando para os fariseus podemos nos perguntar: quando é que agimos como eles, julgando e condenando os irmãos, como se não tivéssemos nossas fragilidades e erros absurdos?

Tantas vezes enchemos nossas mãos das pedras da intolerância, da arrogância e da dureza de nosso coração, e por isso nos consideramos mestres dos outros. Em outros momentos, somos superficiais pregando uma moral e uma lei que está em contraste com o Evangelho.

No final deste tempo quaresmal, somos convidados a contemplar a ação de Deus na história e no nosso caminhar. Precisamos reconhecer a graça libertadora e santificadora do Senhor, como fala o salmo 125(126): “Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!” Pois o nosso Deus é maior do que as leis humanas, ele vai além dos nossos caprichos e interesses pessoais, por que ama a todos dentro das limitações, porém nos pede para seguirmos em frente e não ficarmos parados e também nos ordena que nos convertamos a cada dia, que desocupemos nossas mãos das “pedras” que nos impedem de vivermos a fraternidade e a paz entre os irmãos e irmãs.

Quando entendermos isso e deixarmos enraizar no nosso íntimo essa espiritualidade, poderemos dizer como o apóstolo Paulo: “Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor. Por causa dele eu perdi tudo.” (Fl 3,8). Conhecer a Cristo consiste, portanto, testemunhar esse amor que acolhe, que escuta, que perdoa e que ajuda a prosseguir o nosso caminhar na santidade.

Peçamos ao Senhor misericordioso, que nos ajude a purificar nossas mãos para podermos receber a Palavra e a Eucaristia… que estejamos de mãos limpas para saudar os irmãos e de coração livre para construir a paz e a fraternidade, como sinais do Reino, no mundo. Amém.

 

⇒ POESIA ⇐

TIRA-NOS SENHOR, AS PEDRAS DE NOSSAS MÃOS

Pecadores que somos
Pedimos ao Senhor,
Que nas nossas arrogâncias,
E também nas ganâncias,
Possamos ser vencidos pelo amor,
Querendo a conversão abraçar,
E o caminho da Paz continuar.
Jogando fora o rancor.

Quantas pedras em nossas mãos,
Para nos outros atirar,
Que impedem a caridade,
Que não se juntam para a fraternidade,
E muitas vezes querem dominar,
Numa atitude de opressão,
Impedindo a libertação,
Que Jesus veio pregar.

Olha para nós, ó Senhor,
Ajuda-nos nesta nossa caminhada,
Tira das nossas mãos a violência,
Capacita-nos com a benevolência,
Por onde segue a nossa estrada,
Ensina-nos com a prática do perdão,
Rega com o amor nosso coração.
Que nossa vida seja restaurada.

Seja o nosso encontro contigo Senhor,
Como o da mulher pecadora,
Que em nada se justificou,
Somente em Deus esperou,
A sentença libertadora,
Que Jesus veio a lhe dar,
De seguir em frente e não mais pecar,
E depois ser sua seguidora.

Ilumina Senhor com a tua palavra,
Nossa vida de discípulos ainda pecadores,
Mas que querem seguir em frente,
Querendo ser no mundo semente,
Como humanos anunciadores,
Com mãos livres para edificar,
E os irmãos podermos abraçar,
Caminheiros, discípulos, sonhadores.

 

Que a Palavra e a Luz do Bom Pastor ilumine o seu caminho.