XV DOMINGO DO TEMPO COMUM, ANO C – SÃO LUCAS

 

Leituras: Dt 30,10-14; Sl 68(69); Cl 1,15-20; Lc 10,25-37

 

“A parábola do Bom Samaritano” (1864), por J.E. Millais

 

Ouça o áudio preparado para esta liturgia (pode demorar alguns segundos)

 

⇒ HOMILIA ⇐

Cristo é a Palavra Viva que veio ficar próximo de nós

Lc 10,25-37

 

O Evangelho deste 15º Domingo do Tempo Comum está em Lucas (cf. 10,25-37) e trata da parábola do Bom Samaritano. Este texto nos ensina sobre a caridade, que é a plenitude dos mandamentos apresentados por meio de Moisés, na primeira aliança. E Jesus veio dá um sentido completo e concreto à lei, através mandamento do amor.

Meditemos sobre a parábola: há um homem que foi assaltado e espancando, está sem nada, quase sem vida, sem nome, na estrada de Jerusalém a Jericó. Perdeu suas forças, sua voz e precisa de socorro como tantos assaltados, espancados, sem voz e sem nome, no hoje das realidades humanas, nos âmbitos sociais e econômicos, e que devem fazer parte do olhar de Deus pela ação dos discípulos missionários do Senhor.

Naquela estrada passam muitas pessoas, inclusive ladrões e assaltantes, mas também sacerdotes, levitas, e até homens discriminados culturalmente, socialmente e religiosamente como aquele samaritano. Muitos tinham compromissos, agendas lotadas, preocupação com as normas a ponto de impedir o socorro a alguém que foi vítima de assalto e espancamento. Assim como os outros, o samaritano também tem uma agenda, está de viagem, tem compromissos de negócio, mas não está cego para a necessidade e sofrimento do outro.

Este relato é feito por Jesus para ensinar àquele Mestre da lei, sobre quem é o próximo e também para que ele entenda o significado completo dos mandamentos instituídos na antiga aliança. Os padres da Igreja interpretaram o Bom Samaritano como sendo o próprio Cristo que nas estradas da vida deste mundo acolhe os sofredores, os violentados, cuidando das suas feridas, curando-os e levando-os para a sua casa, a Igreja, para que sejam alimentados e restaurem suas vidas.

Nos dias de hoje os cristãos são chamados a serem os bons samaritanos que colocam em prática o amor, no cuidado aos irmãos, indo ao seu encontro e ficando bem próximo deles, não somente fisicamente, mas, como Deus, que veio ficar próximos de nós, a ponto de sentir a nossa dor, tocar e curar nossas feridas.

Sejamos cristãos atentos às dores que encontramos pelo nosso caminho e aprendamos do Bom Samaritano que a caridade está além das nossas normas e dos nossos cultos, os quais muitas vezes se tornam vazios e sem sentido, porque nos tornam distantes dos irmãos que precisam de nós. E ao sairmos das nossas celebrações, possamos meditar no que Jesus falou para aquele mestre da lei: “Vai e faze a mesma coisa” (Lc 10,37). Pois é a atitude de se fazer próximo do outro, de corpo e alma, que nos faz vivermos plenamente os mandamentos e ganharmos a vida eterna. Amém.

***

⇒ POESIA ⇐

Os Bons Samaritanos de hoje

 

Quem são os bons samaritanos de hoje?
Nos dias e viagens de tantos sofredores,
Que acolhem e curam tantas feridas,
Que recolhem e aliviam as muitas dores?
São os cristãos na vida de caridade,
São também outros na sociedade,
Como corações sensibilizados e sensibilizadores.

Estão nas ruas sem a luz da vida,
Lá nas tocas e apoios da compaixão,
Nos portos seguros do acolhimento,
Nos grupos unidos do amor em ação,
Que se reúnem para pensar o amor,
Para seguirem servindo com fervor,
Colocando o evangelho em plenificação.

São os Bons Samaritanos que se sentem próximos,
Tão próximos a ponto de tocar as muitas feridas,
Buscando remédio para aliviar a dor.
E neste compadecer-se reprogramam a sua vida,
Para servir como um braço do Senhor,
Sendo não somente gesto, mas a prática do amor,
Como chama que no peito é expandida.

E cada um de nós seremos bons samaritanos,
Quando deixarmos o amor de Cristo nos preencher,
Deixando o irmão cada vez mais próximos de nós,
E da sua vida cada vez lhes pertencer,
Afastando os olhares do preconceito,
Não mais tornando em nós o desrespeito,
E das suas necessidades não desconhecer.

E agora contemplemos com muito zelo nosso Senhor,
O Bom Samaritano perfeito e santo,
Caridade divina que veio ao nosso encontro,
Que sentiu nossas dores e enxugou nosso pranto,
Que ergueu os que caíram na cova da morte,
Que os fez caminhar com pés firmes e fortes,
E que tirou dos seus corações todo medo e espanto.

 

*** Que a Palavra e a Luz do Bom Pastor ilumine o seu caminho ***

 

 

XIV DOMINGO DO TEMPO COMUM, ANO C – SÃO LUCAS

 

Leituras: Is 66,10-14c; Sl 65(66); Gl 6,14-18; Lc 10,1-12.17-20

 

“Jesus envia os discípulos”, por J. Tissot (1886-1894).

 

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⇒ HOMILIA ⇐

A alegria dos missionários do Senhor

Lc 10,1-12.17-20

 

O Evangelho deste 14º Domingo do Tempo Comum nos apresenta um texto de caráter profundamente missionário, porque não traz somente um chamado e um envio por parte de Jesus. No texto de Lucas (cf. 10,1-12.17-20), podemos comprovar dois momentos bem distintos sobre a convocação, envio e retorno dos 72: na primeira parte as orientações sobre como viver a missão, e, no segundo momento, a volta dos missionários e a avaliação realizada diante de Jesus. Os 72 discípulos, provavelmente, foram escolhidos a partir do grupo de seguidores que andavam com Jesus em peregrinação pelos diversos lugares da Galileia.

E, então, os discípulos recebem as orientações práticas sobre a missão: ter cuidado com os perigos que encontrarem (os lobos), não ficarem chateados com a falta de recepção, não se preocupar com bagagens e aparatos, mas sim, e principalmente, com a mensagem que cada um deve levar, ou seja, o coração do missionário deve estar livre e cheio de paz para cumprir o mandato do Senhor: “em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz esteja nesta casa!” (Lc 10,5).

Porque a paz é a grande missão do discípulo do Senhor. Paz que foi sonhada pelo povo de Israel quando saiu do Exílio da Babilônia, anunciado pelo profeta Isaías, na primeira leitura: “Eis que farei correr para ela a paz como um rio e a glória das nações como torrente transbordante” (Is 66,12).

A presença do verbo encarnado é a realização plena desta Paz esperada. Outra mensagem do evangelho desta liturgia é sobre o Reino de Deus que está próximo e precisa ser instaurado no meio dos homens, porém não pode ser imposto, pois quando os mensageiros do Reino não forem bem recebidos, estes devem passar a frente sacudir o pó das sandálias e seguir perseverantemente o caminho da missão.

Porém, a missão não se fará somente de mensagens, mas também de ações concretas como a cura dos doentes, a expulsão dos males (demônios) e, sobretudo, o encontro fraterno da partilha com aqueles que receberem, de coração aberto, os missionários de Jesus (cf. Lc 10,7).

A segunda parte é sobre a volta dos missionários e a avaliação feita diante de Jesus. Os 72 voltam com o coração cheio de alegria e grandes motivações, porque exerceram autoridades inclusive sobre demônios (cf. Lc 10,17). A missão não foi feita para o próprio discípulo, mas para o Senhor e em nome do Senhor. É importante ressaltar que a missão não poderá ser feita individualmente, mas acompanhado no mínimo por outro irmão ou irmã, para que haja fraternidade na ação missionária.

E na volta da missão é necessário colocar em comum para se partilhar das maravilhas da experiência. Quando levamos a mensagem de Paz em nome de Jesus, e há um acolhimento, construímos a Paz e a fraternidade no mundo. Isto é, derramamos nos corações humanos a presença do Ressuscitado que também deu a paz nas suas aparições aos discípulos nos dias próximos à ressurreição.

Este texto de Lucas nos ensina que os cristãos batizados de hoje são os convocados para viverem esta missão de Paz. Chamados pelo Senhor para serem sal e luz do mundo (cf. Mt 5,13-16) nas diversas realidades da vida das pessoas, todos são enviados a anunciar a paz a cada lugar que estiver. E o anúncio mais forte será o testemunho de uma experiência com Jesus, reconhecendo que primeiramente a missão é feita em nome dele e para o seu Reino. Faz-se necessário reconhecer que a messe é grande, ou seja, é maior que os nossos espaços religiosos, os grupos que participamos ou os ministérios que assumimos.

Outra necessidade é o crescimento do grupo daqueles que respondem ao chamado do Senhor e que podem dedicar ao serviço do Reino. E para que isto aconteça é preciso que a Igreja esteja em oração (cf. At 12,5). A evangelização não é exclusividade dos bispos, sacerdotes, diáconos, religiosos e os leigos consagrados, mas de todos os batizados. Evangelizar é tarefa de todos. Os casados, os jovens, as crianças, os ministros ordenados e consagrados numa comunhão e partilha, como catequistas e missionários permanentes, cada um com seus dons, em seu próprio campo de atuação e estado de vida cristã.

Para vivermos a vocação missionária precisamos abraçar a dimensão mística do cristianismo, que é o amor ao Ressuscitado dentro de uma realidade de pessoa renovada, carregando as marcas de Cristo em nosso corpo, como testemunhou São Paulo (cf. Gl 6,17). Pois somente percorrendo o caminho de Jesus como aqueles 72 que ele enviou em missão, podemos também partir para missão e retornarmos alegres pelo bem que fizemos, pois fizemos em nome dele e para ele. É a certeza de ser chamado pelo Senhor e a alegria de segui-lo anunciando a Paz do Reino que produz conversão aonde vamos ou estamos. Amém.

***

⇒ POESIA ⇐

Abençoe os missionários, Senhor

Abençoai Senhor,
Os jovens que estão começando,
E os que há muito tempo estão andando,
Aos que acolhem os pobres desamparados,
Aos que rezam mesmo enclausurados.

Abençoai Senhor,
Os que levantam de madrugada,
Que andam a pé pelas estradas,
O que estão em pátrias distantes da sua,
Aos que evangelizam na própria rua.

Abençoai Senhor,
Os que promovem a cidadania,
Os que lutam por uma reta democracia,
Os que evangelizam pela educação,
E os artistas das diversas formas de criação.

Abençoai Senhor,
Os que voltam alegres da missão,
Que promoveram a paz e a união,
Os que do mal e os seus irmãos protegeram,
E que os seus nomes no céu escreveram.

Enfim, abençoai Senhor,
A tantos que não saem do seu próprio lugar,
Mas convertem o seu próprio lar.
Com um testemunho evangelizador,
Promovendo a paz, a harmonia e o amor.

 

*** Que a Palavra e a Luz do Rabí (Mestre) ilumine o seu caminho ***

 

 

XII DOMINGO DO TEMPO COMUM, ANO  C – SÃO LUCAS

 

Leituras: Zc 12,10-11;13,1; Sl 62; Gl 3,26-29; Lc 9,18-24

 

“A profissão de fé de São Pedro” (1886-1894), por J. Tissot

 

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⇒ HOMILIA ⇐

A identidade de Jesus

Lc 9,18-24

 

Neste 12º domingo do tempo comum, contemplamos Jesus em oração com os seus discípulos. O evangelista Lucas (cf. 9,18-24) nos apresenta duas perguntas concretas sobre Jesus. Primeiro: o que as pessoas dizem sobre ele? Em seguida ele se dirige aos discípulos e pergunta: E vós, quem dizeis que eu sou? Neste trecho podemos constatar o testemunho de Pedro na sua profissão de fé quando responde a Jesus: “és o Cristo de Deus” (Lc 9,20), … ou seja, o ungido, o escolhido ou o enviado do Pai (cf. Lc 9,20).

O evangelho prossegue com mais dois momentos bem distintos: Jesus apresenta o primeiro anúncio da sua paixão, morte e ressurreição – O filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da lei, ser morto e ressuscitar no terceiro dia (cf. Lc 9,22). Depois Jesus fala para os discípulos sobre as condições para segui-lo (cf. Lc 9,23-24). Para quem quer segui-lo, deve saber que neste caminho encontrará o sofrimento, a perseguição, a cruz.

No tempo dos discípulos, naquele momento, a pergunta era mais para Jesus na sua natureza humana entre os homens (Jesus histórico) do que para o filho de Deus, o enviado do Pai. Necessariamente se teria uma resposta da parte dos que estavam convivendo com ele na sua caminhada (os discípulos) e outra resposta da parte dos que viam Jesus de longe, nas suas pregações, milagres e curas ou os que ouviam falar dele.

Estes últimos conseguiam vê-lo pelos menos como um grande profeta (os curados ou convertidos), ou como um blasfemo, agitador do povo (os fariseus). Mesmo as escrituras mostrando sobre a vinda de Deus aos homens; mesmo os profetas anunciando a realidade da qual Jesus viveria, não era possível acolher a mensagem do filho de Deus. O profeta Zacarias, na primeira leitura, faz referência ao que Jesus iria passar (a cruz): “Naquele dia, haverá um grande pranto em Jerusalém” (Zc 12,11).

Quanto à resposta de Pedro [“és o Cristo de Deus” (Lc 9,20)], esta deve ser também a resposta dos que hoje vivem a experiência do ressuscitado na comunidade dos batizados, dos que buscam viverem mais fortemente a comunhão. Ou seja, os que vivem a experiência de oração com o Senhor, na Eucaristia, na escuta da sua palavra e o veem como o Deus que salva, que os ama e que está glorificado, ressuscitado, para glorificar todos aqueles que abraçaram o seu amor e se abriram para o infinito da vida celestial.

Porém existem muitos que o enxerga como o “reencarnado”, o “curandeiro”, o “mago”, o “psicológo”, o “sociólogo”, o “grande profeta” etc… Menos como Deus verdadeiro. Isto é o que lemos como títulos de diversos livros espalhados pelo mundo a fora.

Agora podemos também nos perguntar: quem é Jesus para nós batizados? Como acolhemos a sua proposta de vida em nosso caminhar, nos nossos dias claros e nas nossas “noites escuras”?

É importante refletir que a nossa vida de cristãos tem estas três dimensões espirituais e humanas apontadas por Lucas: a oração com o Senhor; a fé na sua ressurreição e consequentemente na nossa; e a consciência de que no caminho do Senhor sempre teremos cruz. Sempre teremos desafios a superar, mas temos uma certeza: ele está conosco nos fazendo uma comunidade fraterna, nos tornando irmãos e irmãs como referência para a paz e a fraternidade no mundo e, ao mesmo tempo, nos encaminhando para a vitória, nos conduzindo e nos preparando para o Céu.

Esta experiência de compromisso nasce do nosso batismo como nos fala São Paulo na segunda leitura: “Vós todos que fostes batizados em Cristo vos revestistes de Cristo” (Gl 3,27). Portanto aos batizados que vivem a experiência de comunidade, vem o compromisso de viverem as mesmas atitudes de Cristo, porque são revestidos da sua presença e vida. E aos que estão de fora, batizados ou não, também o nosso mandato de nos dirigirmos para anunciar a Boa-Nova do Reino, para que estes possam viver um reencontro com Senhor, por que somente nele encontramos a liberdade, a paz e a felicidade perfeita.

A nossa adesão perseverante e consciente ao seu caminho é nossa melhor resposta ao que ele nos perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?” E os cristãos darão sempre uma resposta de fé e que deve ser de plena convicção, quando na oração Eucarística o sacerdote anuncia o mistério da fé e nos respondemos: “Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, anunciamos, Senhor, a vossa morte, enquanto esperamos a vossa vinda!” Meditemos nesta resposta durante a semana.

 

 

***

⇒ POESIA ⇐

Quem é este Senhor?

 

Quem é este Senhor?
Repleto de PAZ,
Que o amor nos traz,
Que nos questiona,
Mas não nos aprisiona,
Que nos mostra o caminho,
E não nos deixa sozinho.

Quem é este Senhor?
Primeiro vivente,
Que de repente,
Faz-me parar,
Para meditar,
E vai me perguntando,
Quando vou caminhando.

Quem é este Senhor?
Que me é sincero,
Quando não espero,
Fazendo-me rezar,
Para a cruz carregar,
Sem decepção,
Rumo a redenção.

Ele é a Verdade,
Nele está a Vida,
Dando-nos a medida,
Para o bem viver,
Para na fé crescer,
Todos que a ele ama,
E não se desengana.

Ele é o vencedor,
O Ressuscitado,
Nosso bem-amado,
Que nos tira da morte,
Com ele somos fortes,
E nas diversas dores,
Faze-nos vencedores.

 

*** Que a Palavra e a Luz do Cristo de Deus ilumine o seu caminho ***

 

 

SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE, ANO  C – SÃO LUCAS

 

Leituras: Pr 8,22-31; Sl 8; Rm 5,1-5; Jo 16,12-15

 

 

Os três anjos que visitaram Abraão, como símbolo da Trindade. (cf. Gn 18), por A. Rublev (*1360+1430).

 

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⇒ HOMILIA ⇐

Santíssima Trindade: um Deus que é comunidade

Jo 16,12-15

 

Na segunda semana após o dia de Pentecoste iniciamos outro momento na Igreja, o tempo comum. Trata-se do percurso mais longo dentro da caminhada litúrgica dos cristãos católicos. No domingo passado, o Círio Pascal foi recolhido para um espaço mais reservado, porque agora são os cristãos que, com a força do Espírito Santo e alimentados da experiência do Tempo Pascal, são chamados a serem luz do mundo, velas acesas da fé nas várias realidades da vida.

Dentro do tempo comum teremos várias solenidades, a primeira é a da Santíssima Trindade, a qual celebramos no domingo após Pentecostes. A Trindade Santa é o fundamento da nossa vivência cristã, pois tudo o que celebramos ou vivemos, segundo a vontade de Deus, é em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.

Há uma reflexão belíssima, inspirada na exortação apostólica Verbum Domini (Palavra do Senhor), de Bento XVI, que pode nos servir muito bem no que se refere à Santíssima Trindade: “Temos antes de tudo a voz divina. Ela ressoa nas origens da criação, quebrando o silêncio do nada e dando origem às maravilhas do universo. É uma Voz que penetra logo na história ferida pelo pecado humano e atormentada pela dor e pela morte. Ela caminha junto com a humanidade para oferecer sua graça, sua aliança, sua salvação. É uma voz que desce logo nas páginas das Sagradas Escrituras que agora nós lemos na Igreja sob a guia do Espírito Santo que foi doado como luz de verdade a ela e a seus pastores.”[1]

É a voz que chamou Abraão, Moisés e orientou os profetas na caminhada do povo, que é apresentado na 1ª leitura, como a sabedoria que existe antes de tudo. Esta voz é o próprio Deus que falou na história e fala para nós, é o Pai de onde tudo procede. (cf. Pr 8,22-31).

A Palavra também tem um rosto, o Verbo encarnado que também estava no princípio. É ele quem nos revela o “sentido pleno” e unitário das Sagradas Escrituras, pelas quais o cristianismo é uma religião que tem no centro uma pessoa: Jesus Cristo, revelador do Pai. Ele nos confirma o que o texto do Gênesis diz: “Façamos o homem à nossa imagem, segundo a nossa semelhança” (Gn 1,26). Porque nós nos parecemos com Deus e Jesus não somente é parecido conosco como também assumiu a nossa natureza.

No Evangelho desta liturgia, ele próprio nos fala do Espírito da verdade e do Pai. Tudo o que o Pai possui é dele (cf. Jo 16,13.15), ou seja, ele revela a missão do Espírito Santo e apresenta o Pai para os discípulos.

E podíamos completar: A Palavra também tem uma fonte de amor que distribui os dons e anima os caminhos da Igreja fazendo criar comunhão e unidade. Ele, que segundo o Credo Niceno-Constantinopolitano, é o “Senhor que dá a vida, que procede do Pai, e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado e que falou pelos profetas.”

Tudo isso para dizer que a Trindade Santa é esse Deus único, que é comunidade, é comunhão, que nos chama a vivermos o amor a partir dele. Santo Hilário, Bispo (*300+368), no seu tratado sobre a Trindade, nos diz: “um só é o Poder, do qual tudo procede; um só é o Filho, por quem tudo começa; e um só é o Dom, que é penhor da esperança perfeita.”[2] Tudo é perfeitíssimo na Trindade, Pai e Filho e Espírito Santo: a infinidade no Eterno, o esplendor na Imagem, a atividade no dom.

Portanto, a Santíssima Trindade é o nosso Deus comunhão que nos acompanha na nossa vida litúrgica e no dia-a-dia da nossa caminhada terrena, pois sempre iniciamos e terminamos nossas celebrações, encontros e momentos de oração, em nome da Santíssima Trindade. Também recebemos os sacramentos em nome da Trindade. Por fim, o nosso dia será sem sentido e a nossa noite incompleta se não iniciarmos e terminarmos em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém!

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[1] Resumo da mensagem do Sínodo dos Bispos ao povo de Deus, em 24 out. 2008. Disponível em: <https://pt.zenit.org/articles/resumo-da-mensagem-do-sinodo-dos-bispos-ao-povo-de-deus/>. Acesso em: 12 jun. 2019.

[2] Liturgia das Horas: Ofício das Leituras – Sexta-feira da 7ª Semana da Páscoa.

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⇒ POESIA ⇐

Um Deus comunidade

 

Poder de onde tudo inicia,
Que ama e que cria,
Que nos faz parecido com ele.
Que tudo nos dá de presente
Ele é o Pai onipotente.

Rosto para nós revelado,
Que por nossas fraquezas é doado,
Que também está no princípio,
Natureza humana oferecida,
Caminho, verdade e vida.

Força de sabedoria e amor,
Também criador,
Que pairava sobre as águas,
Que seus dons a nós oferece,
Que anima e que aquece.

Deus que é comunidade,
Que nos ensina a unidade,
Envolvendo toda a nossa existência,
Que nos reúne como irmãos,
Que nos envia em missão.

 

*** Que a Palavra e a Luz da Santíssima Trindade ilumine o seu caminho ***

 

VIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: Eclo 27,5-8; Sl 91(92); 1Cor 15, 54-58; Lc 6,39-45

 

⇒ POESIA ⇐

A SABEDORIA QUE VEM DO ALTO

 

Ações sábias alegram o coração de Deus,
Pois do Senhor brota o sumo bem,
Que alimenta a santidade do homem,
Que lhe faz coerente também,
Porque o coração cheio de amor,
Traz para a vida a força e o ardor,
Que aos bons e justos convém.

E os olhos limpos das tantas traves,
Fará o sábio para o mundo iluminar,
Porque a sabedoria vem da luz de Deus,
Que ao seu coração vem a orientar,
Para seguir em frente como caminheiro,
Pela longa estrada caminhará inteiro,
Firme e iluminado e sem tropeçar…

Quem for discípulo como seu mestre,
Carregará o amor como fundamento,
No ministério do seu dia a dia,
Será da paz em qualquer momento,
Nascerão bons frutos da sua missão,
No seu caminhar terá compaixão,
Seu testemunho será ensinamento.

Cristãos iluminados pelo Senhor,
Curados das traves e das cegueiras,
Fazendo-os também a outros se guiarem,
E se livrarem das trilhas traiçoeiras,
Que às vezes tentam os atropelar,
Porque a vida é este trilhar,
Existência que se faz em nós verdadeira.

A comunhão nos traz a lucidez,
Pois o olhar do outro pode nos orientar,
E assim o encontro nos conduz a cura,
Em vista de a nossa vida transformar,
Porque a boa mensagem é fruto do seguidor,
Sentido e fortaleza que vem do Senhor,
Pela Boa-Notícia a nos alegrar.

 

⇒ HOMILIA ⇐

Autêntico exame de consciência

Lc 6,39-45

 

A liturgia da palavra deste domingo nos apresenta Jesus se dirigindo aos discípulos para orientá-los quanto às atitudes diante de si e diante dos outros. Era importante que os seus seguidores imprimissem em sua alma uma nova forma de relação com as pessoas e também entre eles próprios. Jesus pergunta: “Pode um cego guiar outro cego?” (Lc 6,39) Como, em vista da missão, o discípulo poderia “guiar” as pessoas em busca do Reino se não percebesse também suas próprias cegueiras e empecilhos? Se não fizesse este exame de consciência voltado para si, que novidade de vida poderia transmitir ao mundo?

Mais adiante, Jesus fala: “Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão” (Lc 6,42). Os discípulos, chamados a serem também luz do mundo (cf. Mt 5,14), necessitavam tirar de sua vida aquilo que os impediam de enxergar o mundo e as pessoas com os olhos de Deus. Como iluminar a vida das pessoas sem primeiro deixar-se iluminar? Poderiam ser guias cegos e assim levar os outros ao buraco da ilusão e da falta de sentido.

Jesus também lembra da árvore que deve ser reconhecida pelos seus frutos (cf. Lc 6,43), ou seja, os seus discípulos precisavam meditar sobre os resultados da sua missão. O fruto do seguidor deveria ser a paz, a justiça, a fraternidade, o perdão, o cuidado aos pobres e necessitados da providência e do amor de Deus. E somente preenchendo o coração com esses valores e atitudes que brotam do evangelho, poderiam falar e agir em favor do bem e do Reino de Deus, pois a boca fala do que o coração está cheio (cf. Lc 6, 45).

O que Jesus orientou aos discípulos, também é destinado a todos os cristãos de hoje. As palavras do Mestre de Nazaré são palavras de sabedoria que devem brotar do coração humano iluminado pela sua Palavra Santa. Sabedoria que o livro do Eclesiástico nos faz refletir, quando diz: “Como o forno prova os vasos do oleiro, assim o homem é provado em sua conversa…. assim a palavra mostra o coração do homem.” (27,6-7). Deus vai iluminando o homem em busca da sabedoria que transforma a sua vida e dos que o rodeiam.

Relendo a Palavra e refletindo os ensinamentos de Jesus e meditando sobre eles, o que poderemos trazer para a nossa vida? Onde nos toca e o que nos motiva a fazer? Que sabedoria podemos cultivar?

Quantas perguntas, e, quantas respostas podemos dar. Jesus nos ensina que não podemos ajudar o outro se não enxergamos primeiro as nossas falhas, ou seja, as traves que nos impedem de nos olhar e nos sentir tal como somos. Quanto tempo perdemos julgando os outros. Ou mais grave ainda, olhando para os outros com hipocrisia e nos fazendo de bons e justos.

Esta liturgia nos estimula a fazermos um exame de consciência muito profundo: Primeiro pensar sobre os obstáculos que nos cegam e nos fazem cheios de egoísmos, de ganâncias, individualismos, apegos às próprias ideias e hostilidade ao diferente. Tudo isso e mais outras atitudes são grandes empecilhos (traves) que barram a ação da Palavra de Deus em nós.

Livres das traves e abertos à sabedoria que vem de Deus os cristãos podem iluminar o mundo e oferecer uma proposta de transformação onde haverá vida nova e um mundo de paz e fraternidade. As guerras acabarão quando as sementes do Evangelho fecundarem novas relações e interações humanas. Quando o julgamento preconceituoso e as cegueiras forem retiradas dos olhos da maldade e a prepotência dos corações humanos.

Somente diante da sabedoria divina e do silêncio em que o ser humano poderá se colocar para se perceber, ele terá possibilidade de ser luz e assim conseguirá enxergar o caminho da vida. Enxergando o seu caminho poderá guiar outros seres humanos. Jesus nos pede que busquemos nos curar de nossas cegueiras para depois poder ajudar os outros.

Somente a humildade que nos leva ao reconhecimento de nossa condição humana poderá nos fazer novos. O cultivo da sabedoria que vem de Deus nos fará produzir bons frutos em qualquer fase de nossa vida. O salmo 91 nos exortará: “O justo crescerá como a palmeira… mesmo no tempo da velhice dará frutos, cheios de seiva e de folhas verdejantes…”.

Que sejamos bons discípulos, como o mestre (Lc 6,40), não acima dele, mas, como ele. Iluminados pelo Senhor e motivados pela sua Palavra que nos fortalece e nos liberta, poderemos dar glória por tantos cristãos, Sal e Luz do mundo, que semeiam o Evangelho em todos os cantos do nosso planeta, em vista de um mundo transformado, cheio de esperança e alegria.

VII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: 1Sm 26, 2.7-9.12-13.22-23; Sl 102; 1Cor 15,45-49; Lc 6,27-38

 

⇒ POESIA ⇐

O AMOR ALÉM DO HUMANO

 

Amor aos inimigos, diz o Senhor,
Fazendo-nos amar na profundidade,
Indo além do dar e do receber,
Que é próprio da nossa humanidade.
Como fugir do convencional?
Como agir contrário ao mal?
E sair da vingança para a humildade?

Muitos humanos estimulam fortemente,
A revanche no lugar do perdão,
O olho por olho como sendo a lei,
Sufocando a reconciliação,
E, então, se esconde a verdade,
Não se vê o que é lealdade,
E emerge a forte contradição.

Fazer o bem aos enraivecidos,
Buscar vencer o ressentimento,
Provoca o bem, e, cura a pessoa,
Alivia os traumas e os sofrimentos,
Estimula a paz e a serenidade,
Faz caminharmos para a liberdade,
Cura a alma e seus ferimentos.

Bendizer os que nos praguejam,
Semear o bem e se desarmar,
Deixar que nosso coração,
Pulse livre sem se inchar,
Para que a vida seja alegria,
Seja inspiração pra poesia,
E, a estrada firme pra se caminhar.

E a oração aos caluniadores,
Que muitos vem a questionar,
Para alguns, quase impossível,
Mas ninguém pode desanimar,
Porque a oração é força vital,
Para os que creem é essencial,
Alimenta a alma e faz caminhar.

 

⇒ HOMILIA ⇐

O amor no alto nível cristão

Lc 6,27-38

 

A liturgia deste domingo vem nos trazer o tema do amor no mais alto nível, o qual brota da boca de Jesus. Trata-se do amor desprendido de recompensas ou de aprovação. O Evangelho de Lucas nos apresenta quatro pedidos de Jesus: “Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam e rezai por aqueles que vos caluniam” (Lc 6, 27-28). São conselhos que nos fazem pensar em nossas atitudes interiores e na prática de nossas posições no dia a dia de nossas vidas, no convívio com os outros.

Como seguir estes conselhos máximos de Jesus? As palavras dele nos inquietam, nos provocam e nos fazem pensar no desafio próprio do ser cristão na sua forma mais autêntica. Querendo ou não, o cristianismo é uma posição na contramão de muitas posturas e concepções, as quais podemos verificar nas nossas funções profissionais, nas escolhas políticas, no modo de vida de muita gente e, infelizmente, também presentes no cotidiano dos grupos humanos e das comunidades cristãs.

Às vezes esquecemo-nos destas palavras de Jesus e, portanto, agimos de forma muito incoerente com o Evangelho. Em diversos momentos podemos até afirmar que o pedido de Jesus é impossível de se viver. Esquecemos que as nossas curas interiores e a nossa conversão acontecem quando arrancamos os ressentimentos, quando nos desprendemos dos julgamentos e nos desfazemos dos desejos vingativos no nosso coração.

Entre tantos pedidos, Jesus ainda diz: “O que vós desejais que os outros vos façam, fazei-o também a eles” (Lc 6,31). Quantas vezes desconhecemos este conselho e fazemos o contrário. Jesus nos motiva a vivermos atitudes novas em vista de um mundo novo. Numa sociedade de tantos incentivos a vinganças, discursos políticos incoerentes com o evangelho, somos chamados a nos despertar e nos iluminar para enxergamos as misturas de joio e de trigo presentes entre nós cristãos e também nos que se dizem cristãos e moralmente corretos.

Importante lembrar o texto da primeira leitura, quando Davi tendo a oportunidade de matar seu inimigo político, Saul, decide que esta não seria a sua atitude coerente com um pretendente a chefe de uma nação… Davi era o candidato ao trono, mas evitou sujar as mãos com o sangue da rivalidade e da sede de poder. Diz ele: “quem poderia estender a mão contra o ungido do Senhor e ficar impune” (1Sm 26,9). Os políticos do nosso país poderiam aprender muito com a atitude de Davi. Quantas vezes se mata o outro ou tenta-se armadilhas para se tomar o poder.

Assim foi a história humana ao longo da sua existência: posições do bem, fundamentadas no amor e conseguintemente fomentando a vida, e, posições do mal, onde está presente a morte por causa das disputas e vinganças as quais desaguam nas guerras e destruições da vida.

O que Jesus nos ensina no Evangelho, Davi já colocou em prática a milhares de anos antes. Mas em Cristo tudo é pleno e em vista do Reino de Deus. Não podemos também esquecer os tantos cristãos que vivem a favor da justiça, da caridade e da paz. O testemunho das pessoas que pregam o amor e encarnam em sua vida a atitudes e posições que a Palavra hoje nos pede, são expressões do evangelho no mundo.

Portanto, a liturgia de hoje nos motiva a olharmos para Jesus e acolhermos suas palavras carregadas das expressões que nos impulsionam a vivermos o seu amor e a sua misericórdia. Palavras, as quais brotam do seu coração divino. E assim, cada cristão é chamado ter as marcas do amor e da misericórdia de Deus.

Cristo é o novo Adão que veio nos visitar com sua humanidade e divindade, e, por isso, nos ensina aquilo que devemos fazer para transformar o mundo e ao mesmo tempo construirmos o seu Reino, que já acontece neste mundo quando se coloca em prática o amor aos inimigos, quando se vive a prática do bem, a benção aos que nos praguejam e a oração em favor dos caluniadores. Com a graça e a força de Deus é possível vivermos estas máximas de Jesus. Amém!

VI DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: Jr 17,5-8; Sl 1; 1Cor 12.16-20,1-11; Lc 6,17.20-26

 

⇒ POESIA ⇐

MERGULHO NO MAIS PROFUNDO DA VIDA

 

Como a raiz da árvore próxima ao rio,
Buscando a energia e a força vital,
Assim é o homem que busca ao Senhor,
Vivendo sua essência original,
Com os pés no chão da vida, firmando,
Com segurança ele vai caminhando,
Sendo mensageiro, e, para o mundo um sinal.

Seguir o caminho da vida aventurada,
Na busca do verdadeiro sentido,
Nos propósitos das bem-aventuranças,
Com o caminho iluminado e fortalecido,
Sem se render a uma posição superficial,
Mas mergulhando na Palavra que é sinal,
E no abraço de um Deus amor e Pai querido!

O Senhor nos alerta a viver a felicidade,
Que se constrói pela nossa conversão,
Que se constrói na coerência e bondade,
Porque ele nos ensina a compaixão,
Nos motiva a vivermos no sumo bem,
Abraçados pela sua misericórdia também,
Porque ele nos oferece a redenção.

A Palavra do Senhor é também alimento,
Para os peregrinos da paz e da alegria,
Para os que promovem a justiça e a vida,
Na realidade da criação, a cada dia,
Porque Deus nos criou para a felicidade,
Para comunhão, o encontro e a fraternidade,
Como Pai amoroso nos fortalece e nos sacia!

 

⇒ HOMILIA ⇐

A felicidade que não se acaba

Lc 6,17.20-26

 

A liturgia deste Domingo nos apresenta Jesus descendo do monte e pregando as bem-aventuranças para as multidões e, especialmente, para os discípulos. A palavra de Jesus se dirige aos pobres, aos que passam fome, os que choram e aos que são odiados (cf. Lc 6,20-22). Esta realidade era percebida por Jesus no seu contato com o povo e na sua realidade conflituosa com os chefes políticos e religiosos da sua época.

A pregação de Jesus denuncia a realidade de pobreza, de fome, de angústia e de hostilidade em que o povo era vítima. Ele traz um alento e ajuda às pessoas a fim de que acreditem que as realidades de sofrimento humanas e terrenos podem passar. Outra realidade surgirá após esta vida. Jesus ao contemplar a realidade de seu povo traz a esperança e a segurança de que Deus está com os que sofrem e que ele quer construir um mundo de justiça, de paz e de alegria já neste mundo.

Os que buscam experiência da confiança no Senhor e que lutam por um mundo melhor são como a árvore plantada junto às águas, que estendem as raízes em busca de umidade (cf. Jr 17,8). Por essa razão, as pessoas que buscam o Senhor encontram força quando são atingidos pelo sofrimento, provindo da pobreza, da opressão e das calúnias que poderiam vir como consequência do discipulado.

A Palavra do Senhor será sempre o alimento que fortalece e a seta que orienta o cristão a seguir em frente. E, portanto, quem coloca sua existência numa busca do sentido mais profundo entenderá o significado das bem-aventuranças pregadas por Jesus. Os discípulos que acolheram o seu chamado entenderam que era preciso viver a experiência de desprendimento (pobreza) e, neste sentido, seriam também os bem-aventurados, os que encontraram em Deus o significado pleno de suas existências.

Num segundo momento a Palavra de Jesus também é dirigida a outro grupo: “Aí de vós ricos, porque já tende vossa consolação… Ai de vós que agora rides, porque tereis luto e lágrimas!” (Lc 6,24.25). Jesus alerta e provoca os que usam as suas riquezas com arrogância, aqueles que zombam dos que sofrem. Os “ais” de Jesus podem estimular a conversão dos avarentos, desumanos e zombadores. Sua voz pode ressoar como um apelo a uma mudança de vida em direção ao amor, à fraternidade e, sobretudo, a caridade.

Os cristãos podem se perguntar se no dia a dia de suas vidas não reproduzem as atitudes e posições desumanas e incoerentes ao evangelho. A cada encontro com o Senhor através de sua Palavra somos convidados a refletir sobre o sentido das bem-aventuranças.

Cabe nos perguntar sobre a provocação que as palavras de Jesus produzem no coração daqueles que se colocaram numa posição de opressão, de injustiça e firmam sua confiança unicamente nas obras e ações humanas, na adoração aos bens materiais, realidade que não possibilitam estabilidade à manutenção da essência do homem.

Precisamos entender que as bem-aventuranças não são uma apologia ao sofrimento, mas uma forma de dizer que a vontade de Deus seja presente e que o ser humano encontre a verdadeira felicidade. As bem-aventuranças nos apontam para a vida eterna, onde tudo é permanente passará e a vida será plena em Deus.

Portanto podemos nos perguntar: como está nossa vida de seguidor e servidor de Cristo?            Como procedemos e agimos no nosso dia a dia? Em quem depositamos nossa confiança? Para responder estas questões é importante vivermos em profundidade a experiência da fé no Ressuscitado e na nossa ressurreição, pois Cristo é o fundamento que nos faz seguir vivendo como peregrinos neste mundo em busca de uma vida de aventurança plena.

São Paulo escreve na sua carta aos coríntios: “… na realidade, Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morrem. Nossa fé cristã deve se fundamentar na verdade destas palavras do apóstolo” (1Cor 15,20). Somente com esta confiança e esta certeza na ressurreição, podemos prosseguir com segurança nossa vida de discípulos e colocarmos nossos dons e testemunho a serviço do Reino de Deus, o qual já se inicia aqui pela nossa vivência fraterna, digna e coerente com o Evangelho. Amém!

V DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: Is 6,1-2a.3-8; Sl 137(138); 1Cor 15,1-11; Lc 5,1-11

 

⇒ POESIA ⇐

AVANCEMOS PARA A MESSE

Avancemos para os campos,
Para as cidades, vilas e favelas,
Anunciemos nelas,
O dom do amor,
Também do fervor,
Sempre a proclamar,
E acreditar,
No que diz o Senhor.

Avancemos com a barca de Jesus,
Em busca das multidões,
Em mutirões,
Para viver a pesca,
Pois ainda resta,
A nossa obediência,
Na paciência,
E na vida honesta.

Avancemos com os discípulos,
Que firmes seguiram,
E se uniram,
A caminhar,
Vivendo a pregar,
As vezes a cair,
Mas sem desistir,
Sempre a levantar.

Avancemos para os mundos humanos,
Em suas existências,
Com suas essências,
Se fazendo união,
Na vida de irmãos,
Nas tantas partilhas,
Que para o mundo brilham,
Pela comunhão!

 

⇒ HOMILIA ⇐

Eis-me aqui, envia-me!

Lc 5,1-11

 

A liturgia que celebramos neste Domingo é toda voltada para a dimensão vocacional, pois, presenta o chamado dos primeiros discípulos de Jesus. Até então, nas liturgias anteriores, vimo que Jesus agiu e falou sozinho e dentro da sinagoga, dentro do templo. A partir de agora ele está em movimento, sairá do espaço religioso. Formará o seu grupo para presenciar o Reino, pois agora, cercado de seguidores fará a experiência da missão no mundo.

Podemos imaginar o cenário deste texto: uma manhã à beira do mar; uma multidão que cerca Jesus; pescadores desanimados pelo insucesso no seu trabalho, barcos vazios… tentaram a noite toda e não tiveram êxito na pesca.

O texto de Lucas terá três momentos que poderão ser observados para a nossa reflexão: (i) a pregação de Jesus à multidão; (ii) a pesca milagrosa; e (iii) o chamado aos quatro primeiros discípulos – Pedro e André; Tiago e João.

Depois dos ensinamentos às multidões, Jesus ordena a Pedro e aos seus companheiros que avancem para águas mais profundas e lancem as redes (cf. Lc 5,4), pois estavam na margem. Esta ordem arrancou Pedro da acomodação e do desânimo, que somente pela obediência ao Senhor atende ao pedido.

O resultado da ação dos futuros discípulos é o grande milagre da abundância de peixes que quase rompe as redes. Em seguida vem a confissão de Pedro: “Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador!” (Lc 5,8). Este reconhecimento de que Jesus é o Senhor já sinaliza para a sua ressurreição quando vencerá a morte e trará a todos a prova de que ele é o Deus verdadeiro e quer que todos ressuscitem.

O terceiro momento é o chamado dos discípulos para serem pescadores de pessoas, para se lançarem no mundo com Jesus e viverem a missão de anunciar que o reino de Deus está próximo. O texto diz: “eles levaram os barcas para a margem, deixaram tudo, e seguiram a Jesus.” (Lc 5,11).

A barca é um símbolo que representa a Igreja onde Jesus opera o milagre da abundância, onde ele sacia todos da fome. Fome que deixa as pessoas desanimadas e sem motivação para continuar a jornada da vida.

Para os que seguem de forma mais radical o Senhor, faz-se necessário ser obediente para ir além das práticas religiosas e se lançar no mundo para testemunhar que a salvação está a nossa porta. Também é importante que no dia-a-dia da missão cristã, quando faltar a coragem e o ânimo para continuar, precisamos nos voltar para o Senhor e confiar na sua Palavra. Ela nos encoraja a continuar e a sermos sal e luz do mundo, onde quer que estejamos. Ele também nos aponta o caminho a seguir.

É importante para os missionários o reconhecimento de que somos pecadores e precisamos confessar a nossa fé no Senhor que nos chama; também é importante a vontade de ser melhor a cada dia, pois é isto que nos faz crescer. Precisamos discernir quando é necessário deixar aquilo que para nós “é tudo” e seguir em frente, mesmo continuando a nossa profissão, colocando os nossos bens e nossas capacidades (dons) a serviço do Reino.

Peçamos ao Espírito Santo o dom fortaleza para sermos melhores cristãos e digamos, como São Paulo, que somos o que somos pela graça de Deus (cf. 1Cor 15,10) e completemos com as palavras do profeta “aqui estou! Envia-me!” (cf. Is 6,8).

IV DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

Leituras: Jr 1,4-5.17-19; Sl 70(71); 1Cor 12,31;13-1-13; Lc 4,21-30

 

⇒ POESIA ⇐

MARCADOS PELO AMOR

Somente no AMOR,
Somos capazes de caminhar,
Seguir firmemente e sem desanimar,
Caminhar com o coração livre e dizer:
Que a caridade não se deixa vencer,
Pois o nosso julgamento final será pelo amor.
Quando em nós houve o agir acolhedor,
E a esperança nunca a desaparecer!

Somente com o AMOR,
Exalamos o perfume da vida verdadeira,
Vindo da flor que sai da videira,
Vida que segue até eternamente,
Se estendendo com calma e fraternalmente,
Fundamentada na Palavra sempre Viva,
Encarnada e com a unção ativa
Que se cumpre no hoje no povo crente.

Somente no AMOR,
Semeamos também nos gestos de profecia,
Da verdade não aceitada que se anuncia,
Porque a Palavra está na boca dos profetas,
Que falam, agem, motivam e despertam,
Denunciam as mentiras e a injustiças,
Os poderes, opressões e cobiças,
E por isso caminha também em alerta!

Somente no AMOR,
Somos capazes de entender,
Que desde o ventre e ao nascer,
Fomos por Deus, chamados e amados,
A serviço do Reino a ser implantado,
Que se dar na vida e na comunhão,
Na comunidade viva dos irmãos,
No encontro que nos faz congregados.

 

⇒ HOMILIA ⇐

A caridade como chave para o Reino de Deus

Lc 4,21-30

 

O Evangelho deste Domingo é a continuidade da liturgia dominical anterior. O texto do evangelista Lucas inicia exatamente onde terminou no Domingo passado: “Então começou a dizer-lhes: ‘Hoje se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura’.” (Lc 4,21). Diante da afirmação de Jesus dois grupos tiveram reações diferentes: os que davam testemunho a seu respeito, admirados com as palavras cheias de encanto que saíam da sua boca (cf Lc 4,22). E os que ficaram furiosos, que expulsaram da cidade e queria lançá-lo no precipício (cf. Lc 4,28-29).

Este texto nos traz duas reflexões importantes para a evangelização da Igreja nas diversas realidades humanas e culturais. Podemos recordar que diante das palavras de Jesus um grupo ficou admirado e até dava testemunho de Jesus, pois o reconhecia como um conterrâneo seu: “Não é este o filho de José?” (Lc 4,22). Porém outra turma ficou furiosa, pois quando Jesus faz memória da Primeira Aliança lembrando a ação de Deus em favor da viúva em Sarepta e do leproso Naamã que eram de outros povos, justificando que a ação de Deus não está restrita a um grupo de privilegiados, estes os expulsaram e queria assassiná-lo, lançando-o no precipício.

Pois bem, para os cristãos que estão na caminhada evangelizadora levando a Palavra como discípulos missionários, faz-se necessário estar atentos a estas duas realidades do mundo: na pregação sempre haverá os que escutam e ficam até admirados, depois dão testemunhos como seguidores do Senhor. Por outro lado, há os que não aceitam e até matam os profetas da verdade tentando calá-los.

Na primeira leitura lemos sobre o profeta Jeremias: “antes mesmo de te modelar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações.” (Jr 1,5). Aqui vale frisar a experiência da profecia. Os cristãos são chamados a viverem pela vida e pregarem a experiência de ser, às vezes hostilizado, ignorados ou perseguidos como Jesus.

Meu irmão, minha irmã, você já se sentiu perseguido porque falou verdade, porque denunciou alguma injustiça ou porque se colocou a favor da vida?

E há ainda outra dimensão própria dos cristãos e que Lucas faz questão de frisar nos seus textos: a universalização da Palavra. Ou seja, inicialmente, todos são destinatários da salvação, dentro da sua liberdade e possibilidade de aceitar ou não.

Quando se fala das nações é exatamente neste sentido da Palavra dirigida a todos os povos e não somente a Israel. Percebemos então que já havia uma mensagem da Palavra de Deus através dos profetas que fomentava a universalização da libertação esperada pelos hebreus, porém dirigida a todas as nações.

Por fim, é importante meditarmos sobre a carta de São Paulo aos coríntios: “atualmente permanecem estas três coisas: fé, esperança, caridade. Mas a maior delas é a caridade.” (1Cor 13,13). Neste versículo temos a compreensão da base da vivência cristã, seja na evangelização ou nas ações sociais. Tudo o que fazemos deve ser fundamentado no amor com sentido caritas, pois sem este fundamento nossa pregação fica vazia e nossa ação será apenas uma filantropia fria e sem compromisso com o outro.

Peçamos as luzes do Espírito Santo para que ilumine nosso coração e nossa mente para entendermos o sentido principal do nosso ser cristão. Fiquemos com a máxima de São João da Cruz: “Pois ao entardecer do meu mortal viver serei julgado pelo amor.” Amém

III DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C, SÃO LUCAS

 

Leituras: Ne 8,2-4a.5-6.8-10; Sl 18(19); 1Cor 12,12-30; Lc 1,1-4; 4,14-21

 

⇒ POESIA ⇐

O ESPÍRITO DO SENHOR ESTÁ SOBRE NÓS

O Espírito do Senhor está sobre nós
Para que ilumine o nosso caminhar,
Para que purifique o nosso olhar,
Para que no corpo do Senhor,
Encarnemos o seu Amor,
E não venhamos a desanimar.

O Espírito do Senhor está sobre nós
Para fazermos o Reino acontecer,
No “hoje” desde o amanhecer,
Como naquele dia da Ressurreição,
Certeza da nossa redenção,
Infinita nossa vida há de ser.

O Espírito do Senhor está sobre nós
No seguimento de discípulos missionários,
Na vida dos pobres sendo solidários,
Para sermos sal e luz do mundo,
Vivendo com amor profundo,
Trabalhando como dignos operários.

O Espírito do Senhor está sobre nós,
Na escuta da Palavra e na oração,
Como membros em fraterna comunhão,
Vivendo em Cristo o amor perfeito.
Pra ser feliz não há outro jeito,
Somente buscando a santificação.

 

⇒ HOMILIA ⇐

Jesus é o cumprimento das Escrituras

Lc 1,1-4; 4,14-21

 

A liturgia deste Domingo, no que se refere ao Evangelho, nos apresenta dois trechos distintos de Lucas, ambos carregados de uma profunda mensagem. Na primeira parte (1,1-4) trata-se da introdução onde podemos observar as quatro etapas da formação dos evangelhos: (i) os acontecimentos sobre Jesus (cf. 1,1); (ii) a pregação dos apóstolos e discípulos de Jesus, os quais Lucas chama de testemunhas oculares e ministros da palavra (cf. 1,2); (iii) vários escritos menores também transmitidos pelos primeiros cristãos (cf. 1,2); (iv) o próprio escrito do Evangelho como lemos atualmente, quando o evangelista fala que decidiu escrever de modo ordenado (cf. 1,3).

Toda a introdução é dirigida a um certo Teófilo, que os estudos bíblicos e teológicos traduzem como “amigo de Deus”, ou seja, aqueles que estão abertos ao chamado do Senhor e querem seguir a sua Palavra e o seu caminho.

A segunda parte nos mostra Jesus indo à sinagoga como de costume. Na liturgia das sinagogas, celebradas aos sábados, eram proclamadas duas leituras: uma do Pentateuco, seguida do comentário de um especialista; e a outra tirada dos profetas, que poderia ser comentada por qualquer pessoa que tivesse a permissão do presidente da assembleia.

Parece que para muitos naquele sábado era uma celebração comum como as outras, mas não foi. Após a leitura feita por Jesus, algo era diferente: todos estavam de olhos fixos nele (cf. Lc 4,20). Jesus tem a permissão e faz uma homilia, afirmando que aquela palavra do Profeta Isaías (cf. 61,1-2) se cumpriu naquele momento. Mesmo que o povo esperasse por alguém para trazer a libertação de Israel anunciada pelos profetas foi difícil aceitar a afirmação de Jesus.

Jesus anuncia o programa da sua missão: a Boa-Nova (Boa-Notícia) direcionada aos pobres (devedores, cativos, doentes, oprimidos) que esperavam da parte de Deus tal benevolência. O olhar voltado para os pobres está mais presente em Lucas do que nos demais evangelistas, embora seja esse o projeto do Reino apresentado por Jesus. Ele é a própria Palavra encarnada, nele está encarnado o sonho do povo de Deus prefigurado na primeira leitura (livro de Neemias), quando Esdras celebra com o povo a Palavra de Deus para nutrir a esperança e para a renovação da Aliança com o Senhor. O texto de Neemias nos apresenta uma lista de orientações litúrgicas e, sobretudo, mostra-nos como deve ser o verdadeiro culto a Deus.

Ao declarar: “hoje se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura.” (Lc 4,21) Jesus nos apresenta o cumprimento da chegada do Reino, o “hoje” determina que chegou a hora de vivermos plenamente a Palavra como regra principal, pois a libertação anunciada por Jesus é a própria redenção do homem, a salvação para todos. O vazio que torna as pessoas escravas das drogas, do álcool, da prostituição do corpo e das ideias relativistas é a maior pobreza. Além disso, o comodismo e a incoerência dos cristãos também trará consequências como a pobreza material, moral e as injustiças para os pequeninos de Deus.

Portanto, Jesus indica o que é necessário que façamos como seguidores dele e, sobretudo, como membros do seu corpo. É o que fala São Paulo na primeira carta aos Coríntios: “Vós, todos juntos, sois o corpo de Cristo e individualmente, sois membros desse corpo.” (1Cor 12,27). Ser membro do corpo de Cristo é sentir a dor dos outros membros, é também valorizar cada pessoa com dignidade independente do que seja, do que faça e do que tenha.

Para finalizar esta reflexão, podemos nos perguntar: qual o meu programa de vida cristã? Como batizado, será que tenho os olhos fixos em Cristo, para melhor viver o testemunho autêntico de um discípulo missionário do Senhor?

Peçamos ao Espírito Santo que nos conduza na nossa missão de seguidores de Cristo, sempre se sentindo como membro do Corpo de Cristo. Amém!